Minha experiência no mutirão de regularização migratória na Pacto pelo Direito de Migrar (PDMIg)

Autora: Mitiko Nomura

Imagem: Registro durante o mutirão de direitos organizado por Jean Katumba, presidente da PDMig, com a participação de um estudante voluntário e da mestranda Mitiko Nomura (19/10/2024).

No dia 19 de outubro, um desses sábados chuvosos e cinzas frequentes em São Paulo, estive no escritório da organização Pacto Pelo Direito de Migrar (PDMig) para participar de um mutirão voluntário para atender pessoas imigrantes e refugiadas. Localizado em um prédio comercial antigo de ladrilhos vermelhos, no meio do caminho entre a Catedral da Sé e o Pateo do Colégio, a PDMig é uma organização da sociedade civil que existe desde 2013, originalmente criada sob o nome “África do Coração”. [https://www.instagram.com/p/CdbgrKAOTSd/?utm_source=ig_web_copy_link].

Quando cheguei pela manhã, já havia uma fila, com algumas pessoas sentadas no corrredor. Dentro da sala da PDMig encontrei Jean Katumba, presidente da organização, e que foi responsável por orientar eu e mais um participante externo nas atividades do mutirão. Jean, que é presidente da organização e está estudando Direito, contou que está há mais de dez anos no Brasil, enquanto mostrava as instalações do PDMig e me entregava um colete para identificação.

O mutirão de atendimentos teve como objetivo promover a regularização documental de pessoas  imigrantes e refugiadas em situação de vulnerabilidade. A regularização é listada como um dos fundamentos da política migratória brasileira (Art. 3º, inc. V, da Lei nº 13.445/2017) [https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/l13445.htm], sendo essencial para assegurar o reconhecimento formal da pessoa perante a sociedade, de modo a promover o pleno acesso a direitos. Nas duas horas de atendimento, que ocorria excepcionalmente no sábado para que Jean pudesse nos orientar, pudemos atender cerca de 20 pessoas. Todos migrantes que foram atendidos nesse dia eram recém chegados ao Brasil e tinham nacionalidade angolana, incluindo crianças acompanhadas de suas famílias.

Apesar de toda pessoa imigrante e refugiada possuir o direito de ser informada sobre as garantias que lhe são asseguradas para a regularização migratória (Art. 3º, inc. XVI, da Lei nº 13.445/2017), a burocracia brasileira muitas vezes impede que esse direito se realize. Assim, organizações como a PDMig auxiliam nesse processo de obtenção e emissão de documentos , tais como:

  • Registro Nacional Migratório (RNM) – número de identificação civill da pessoa migrante, que possibilita acesso à autorização de residência (permissão para residir de forma provisória ou definitiva no Brasil). É concretizado na Carteira de Registro Nacional Migratório (CRNM).
  • Cadastro de Pessoa Física (CPF) – registro obrigatório de toda pessoa no Brasil, seja imigrante ou não, responsável por facililtar a comprovação da identidade e o acesso a benefícios, tais como a participação em programas sociais do governo.
  • Protocolo de Refúgio – documento de identidade que atesta a regularização da solicitação de refúgio, sendo necessário renovar periodicamente.
  • Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS) – garante o acesso a alguns dos principais direitos trabalhistas, como seguro-desemprego, benefícios previdenciários e FGTS.

Além de contribuir para a promoção de direitos e acesso à cidadania, de modo a contribuir com as comunidades de migrantes, o mutirão é oportunidade de aprendizado e desenvolvimento de habilidades curriculares, próprias da atividade extensionista. Também é oportunidade de conhecer novas pessoas e histórias. Em um dado momento, o voluntário que me acompanhou no mutirão falava com um jovem quando disse “Poderia perguntar ao seu pai?”, enquanto apontava para o senhor sentado na outra cadeira. Ambos riram, e disseram que não eram parentes. A confusão veio do fato de que muitos angolanos chamam-se entre si de palavras que remetem ao parentesco (como no caso de “irmão”, “irmã”, etc).

A partir dessa experiência no mutirão de direitos, pude conhecer e me aproximar do trabalho da PDMig, o que foi possível a partir da minha colaboração com o projeto de extensão Fronteiras Cruzadas na FFLCH-USP. As atividades realizadas em campo com membros do coletivo concretizam a proposta de via de mão-dupla da extensão universitária, promovendo sinergia dos processos educativos entre o ensino superior e a comunidade a sua volta. O mutirão é apenas uma dentre diversas formas de engajarmos a extensão universitária com a pauta migratória. Nesse sentido, através do Fronteiras Cruzadas foi possível colocar em prática meu conhecimento jurídico, de modo a apoiar a comunidade de imigrantes e refugiados que necessitam de auxílio na regularização documental. O mutirão, portanto, além de propiciar formação relevante, é também reflexo do objetivo de atuar coletivamente para impactar a realidade social em escala local.

*M. Mitiko Nomura é mestrande no Programa de Mestrado Acadêmico em Direito e Desenvolvimento da FGV Direito SP, com apoio da CAPES, por meio da bolsa CAPES-PROSUP (Programa de Suporte à Pós-Graduação de Instituições de Ensino Particulares), e da Fundação Getulio Vargas, por meio da bolsa Mario Henrique Simonsen de Ensino e Pesquisa. Graduade pela Faculdade de Direito da USP, já atuou na advocacia privada, e atualmente é pesquisadore do Centro de Ensino e Pesquisa em Inovação (CEPI) da FGV Direito. 

Conheça mais sobre o trabalho da PDMIG: A PDMIG - Pacto pelo Direito de Migrar é uma organização privada, sem fins lucrativos e apartidária, fundada e gerida por refugiados e imigrantes de diversas origens, dedicada à promoção dos direitos migratórios e à inclusão social de migrantes. Atuando desde 2013 e formalizada em 2016, a PDMIG visa integrar migrantes, combater a discriminação e fomentar a participação ativa nas políticas públicas locais e globais. Suas principais diretrizes incluem a inserção social, o protagonismo migrante, e o combate à xenofobia, promovendo um movimento global de migração justa e informada.

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